A conversa mudou — e não por cliquebait. Pesquisadores de Harvard publicaram em 6 de agosto de 2025 um estudo na Nature mostrando que o cérebro tem lítio natural e que a queda desse lítio aparece cedo, já no estágio de MCI, antes do Alzheimer avançado. Em camundongos, repor lítio com um sal que “dribla” a captura pelos depósitos de amiloide reverteu memória e danos. É promissor? Sim. É “cura”? Calma. HMS Harvard
O achado conversa com pistas antigas: populações expostas a traços de lítio na água tendem a ter menos demência — efeito não linear, mas consistente no maior estudo dinamarquês (73.731 casos). Tradução: talvez exista uma “faixa saudável” de lítio ambiental. Não é prova de causa em humanos, mas é fumaça suficiente pra investigar direito. PubMed
Harvard encontrou queda precoce do lítio no cérebro ligada ao Alzheimer e reverteu sinais da doença em camundongos com lítio orotato em microdose. Evidência humana é sugestiva, mas ainda insuficiente para prescrição ampla. Nature
Por que isso importa — e por que agora
Vamos ao núcleo: o estudo mostra três peças novas. Primeiro, lítio endógeno existe e cai já no MCI. Segundo, a amiloide sequestra lítio, reduzindo sua disponibilidade — um possível gatilho inicial do processo. Terceiro, reposição com lítio orotato (dose mil vezes menor que psiquiatria) reverteu placas, emaranhados de tau, inflamação, perda de sinapses e memória em camundongos, com sinal de mediação por GSK3β. Em linguagem simples: menos lítio, mais desorganização; recuperar lítio certo, na hora certa, reorganiza. Nature
Você reparou no “em camundongos”, né? Ótimo. A ponte pra humanos existe, mas não está pronta. Ainda assim, a coerência com estudos populacionais e ensaios pequenos pesa a favor de testar. PubMed
Lítio e Alzheimer: o que a ciência sabe até agora
No mundo real, o que temos em humanos? Dois movimentos. Um, epidemiologia: no estudo dinamarquês, pessoas vivendo em áreas com >15 µg/L de lítio na água tiveram IRR 0,83 de demência versus 2–5 µg/L (ou seja, risco ~17% menor). É associação, sujeito a confundidores geográficos — mas robusta. PubMed
Dois, ensaios clínicos pequenos. Em São Paulo, 61 idosos com MCI receberam lítio em dose subterapêutica por 2 anos: o grupo lítio estabilizou cognição enquanto o placebo piorou; após 36 meses, houve +30% de Aβ1-42 no líquor (biomarcador que sugere melhor clearance). Não é milagre, é efeito modesto, porém repetível e clinicamente relevante para quem está na borda. Cambridge University Press & Assessment
E as microdoses? Há um estudo duplo-cego de 300 µg/dia em pacientes com Alzheimer mostrando estabilização cognitiva por 15 meses. É pequeno e antigo, mas soma no mosaico. Ensaios de prevenção maiores (como LATTICE) estão em curso — ainda sem resultados finais. PubMed
Como (talvez) funciona — sem jargão inútil
Pense no lítio como um modulador de vias de estresse neuronal. Quando falta, GSK3β tende a hiperativar, e isso empurra a cascata para mais amiloide e tau — os vilões clássicos. Repor no patamar fisiológico parece reduzir esse ruído, melhorar sinapses, mielina e a “faxina” imune (microglia). Em camundongos velhos, isso devolveu memória. Em humanos, os biomarcadores caminham na mesma direção, mas precisamos de RCTs grandes para bater o martelo. Nature
O que muda pra você — e o que não muda (ainda)
Olha, não é hora de sair comprando lítio na internet. Lítio em excesso é tóxico (rim/tiroide), lítio orotato não é aprovado para Alzheimer e autoprescrição é convite para problema. O que muda é a agenda: medir lítio pode virar biomarcador precoce; “sais que evitam captura pela amiloide” viram candidatos a prevenção. A curto prazo, seu passo prático é acompanhar/participar de estudos sérios, não experimentar em casa. HMS Harvard
Quer um mini-caso concreto? Profissionais com histórico familiar de demência, 60+, cognitivamente íntegros, mas ansiosos por prevenção, frequentemente perguntam sobre microdoses. O que recomendo? Elegibilidade para pesquisa clínica e gestão de risco clássico (pressão, sono, atividade física, educação cognitiva). O lítio pode entrar? Somente dentro de protocolo com monitorização. PMC
O que acompanhar nos próximos 12–24 meses
Três frentes: 1) RCTs de micro/baixa dose (desfechos clínicos e segurança em idosos); 2) validação de lítio sérico/tecidual como screening em MCI e pré-sintomáticos; 3) novos sais “anti-captura” (além de orotato), com farmacocinética compatível para humanos. Quem comunica isso de forma transparente, com dados abertos, merece sua atenção. Nature
A descoberta de Harvard reorganiza o campo: lítio não é só remédio psiquiátrico; pode ser peça fisiológica que, quando falta, abre a porta do Alzheimer. Isso não autoriza suplementação por conta própria. Resumo do jogo: sinal forte em laboratório, evidência humana inicial; próximo passo é ensaio grande.